quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Eu sinto que tenho duas pessoas em mim: Um eterno garoto que todo mundo conhece, e outro que ninguém faz idéia de como se construiu. Essa é a maior dificuldade que enfrenta alguém que se muda em busca de seus sonhos, e tenho convivido com isso todos os minutos do meu dia. O meu passado encharcado dos momentos que eu vivi pertence ao mesmo corpo de um mundo completamente virgem do meu presente, e tolero tudo isso esperando ser uma soma dos dois no futuro.
A Kombi que antes eu pegava para ir à escola transformou-se no metrô, ou num ônibus que às vezes ainda esqueço o número; a única avenida da minha cidade transformou-se num labirinto inesgotável de possibilidades e de erros; a escola que eu achava enorme transformou-se num prédio incomensurável, cheio de salas, laboratórios e principalmente pessoas. E finalmente, as tais pessoas que eu realmente conheço não cruzam comigo pelos corredores da UERJ, nem bebem cerveja comigo no Pavão Azul, pois essas pessoas só vieram para o Rio de Janeiro dentro de mim.
A violência da cidade grande nunca me assustou, mas a certeza de que vou voltar para casa e me encontrar sozinho com a minha TV me assusta diariamente, mais até que as imagens terríveis de tiroteios que assisto na minha maior companhia.
Reparo, às vezes, que é fácil lidar com os colegas, mas muito difícil fazer amigos, porque a faculdade é o lugar de se viver tudo aquilo que a vida pode proporcionar de mais efêmero. Não que não se construam amigos por lá, mas que nela seus colegas estão mais preocupados com o trabalho do professor tal, ou com a leitura do capítulo 14 do livro do Hobsbawn. E que, portanto, há menos tempo para a entrega que exige a amizade.
De forma alguma quero dizer que as efemeridades da vida são menos importantes que as coisas duradouras, nem que a escola do interior é melhor que a faculdade. Só digo que são diferentes, e que é difícil conviver com antíteses dentro de si.
O professor não saber seu nome; o receio de sair com seu notebook na rua; o tempo gasto para chegar à casa de um amigo seu... Tudo isso pertence a um mesmo mundo que também conta com a facilidade de ir a uma peça de teatro, a oferta de shows e restaurantes, a imensa possibilidade de escolhas e preferências que só a cidade grande pode te oferecer.
Aconselho a quem puder vivenciar de ambas as experiências que o faça, pois o mundo é muito grande para nos recolhermos ao nosso nicho, mas que carregue consigo tudo aquilo que construiu antes de mergulhar nesse mar tão perigoso que é viver.