segunda-feira, 30 de novembro de 2009

30.11

nasceu sem pedir licença, sem que a bolsa estourasse, sem contrações nem avisos prévios. nasceu sem gestação, sem desejos, sem enjoos, sem coito, sem nada. nasceu sem rosto, sem pernas, sem olhos, sem boca, sem sentidos. nasceu em mim assim, desprezando choro, sangue e parto, veio do tudo, do lógico, da consequência. veio até mim de repente, de surpresa.

a morte nasceu pra mim em mim. a morte de uma das partes mais bonitas que eu construí. ela veio em forma de texto, de letras construídas para me destruir, de palavras sequenciadas visando ao meu desespero. mas eu já morri, não desespero mais, não sangro mais, não vivo. esse é o maior defeito da morte, ela nasce quando a vida acaba, não enxerga seu estrago, não ri da sua tragédia. a morte morre com o morto, no caso, morreu comigo.

mas a vida vive, e aproveita enquanto ela vive, porque um dia a morte nasce como em mim nasceu. e apaga tudo.

que vivemos juntos.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

à minha professora de português

acordou antes mesmo de dormir. inquieto sem aquele pensamento pré-sono. só pensava em como não tinha nada para pensar. que vida, cara. que vida é essa desse rapaz que não tem no que pensar? que vai escrever qualquer merda às cinco da manhã. que rapaz é esse que enxergo em mim, deitado naquela cama? que texto em terceira pessoa é esse em que a terceira pessoa sou eu?

fiquei confuso. acordar antes de dormir não é poesia, é circunstância. é porque eu desliguei tudo, tirei o disco, fui dormir e acordei revoltado com a minha falta de imaginação. é porque eu não tenho no que pensar pra dormir e então fico acordado. ou ele fica, sei lá. ficamos, eu e ele acordados nesse apartamento minúsculo onde eu tenho que dividir os cômodos com ele. e ele me irrita, não tem assunto, inventa musas, não tem desejos. cara babaca! completo consigo e eu aqui procurando qualquer coisa para me completar. enquanto busco um pensamento pra dormir, ele cria sofrimento pra sofrer. baita confusão minha comigo! escrever a essa hora dá nisso, texto mal calculado, mal escrito, confusão de personagens onde só há um. confuso, é verdade, mas só um.

acho que tô fugindo do estilo do blog, mas eu preciso fazer alguma coisa pra mudar. tá ficando meio chato isso de sofrer o tempo todo pelo mesmo motivo. queria ser mais livre pra escrever nesse espaço aqui, afinal ele é meu!

não, ele não é mais meu. é dele. daquele que sofre e é completo ao mesmo tempo, que é só e mal acompanhado, que trata o amor como cigarro, que sonha com um vestido, etc. o espaço é do personagem que eu criei pra mim sem saber, e que já fez até epitáfio pra si mesmo. que macabro! quanta tristeza! não sou tão triste assim, mas ele é e acha bonito ser. deixa o camarada sofrer as dores dele, não confunda com as minhas. ou até confunda porque elas se confundem mesmo, mas o Thiago não é tão caído assim, não mesmo, ele até usa "caído" numa frase. gíria, coisa pobre. ainda ouve samba, ainda faz piada, bebe cerveja com os amigos, ama e sofre. sem "quimeras" - odiei usar essa palavra no último texto, pedante demais. o Thiago sofre com o Fluminense, ahh com isso ele sofre, ainda mais em 2009. o brilho no olhar que foi lembrado pode até não existir mais, mas o resto tá por aí: o bigode, o chapéu, as sandálias - que não sejam da humildade -, as ambições. tá tudo aí misturado com esse babaca que só usa letras minúsculas. nem sei por que usei agora, mas vai dar trabalho mudar tudo, é mais um dos vícios que adquiri e que não consigo remediar.

nossa, escrevi tanto que nem sei mais do que eu tava falando. acho que era da falta de pensamento antes de dormir. agora vou deitar e pensar no que a senhora vai achar de tudo isso aqui. epifania? foi você que me ensinou o que era. será que cabe? sei lá, decerto que era mais fácil fazer as suas provas que carregar comigo um personagem que por tudo sofre e de tudo ama.

inconveniência

somos matéria de nossos sonhos, somos seus criadores, podemos e devemos produzí-los.

eu sonhei por nós dois. acordei quando você fugia dos diálogos com frases desconexas que não faziam parte das minha ideias quiméricas. quando você disse que não queria mais, que preferia fazer um outro feliz, nesse ou noutro tempo. acordei pra cortar e mandar repetir. você errou o texto, meu bem, ainda não era hora de falar isso. você maculou minha fantasia, cagou nas minhas frases feitas. você poluiu as minhas cenas, perturbou a estética maravilhosa que eu tinha produzido. desconfiou do meu roteiro, do meu talento para nos criar felizes, da minha capacidade inventiva. você duvidou de mim. das linhas que eu tracei para nossos próximos dias e meses. dos cenários que eu escolhi, da roupagem que eu dei. que eu lhe dei a você. a mim. você não deu crédito ao meu trabalho e quis impor seu nome nos créditos. quis assinar um sonho que era meu e que você estragou por não sonhar comigo. você é uma estúpida por jogar tudo fora, por improvisar onde não havia improviso. por sentir-se livre onde não havia liberdade. havia um sonho a ser vivido, havia uma vida a ser sonhada. mas você não quis, você não se permitiu viver sonhando, nem me permitiu sonhar com a vida.

você acabou com um romance lindo que eu tinha feito só porque eu tinha te refeito. e saiba: a minha você era bem melhor que a real. eu tinha lhe descrito muito melhor do que é na verdade. você não se deixou ser melhor, não foi capaz de enxergar a beleza que eu te acrescentei.

acabou com o romance porque você tinha sido apenas minha matéria, e isso de ser matéria nunca lhe foi o bastante, prepotente destruidora de fantasias.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

é que pra escrever preciso passar mal. preciso sofrer das piores doenças, estar de mal com o mundo e querer gritar. eu não grito, eu rabisco. eu não choro lágrimas, mas palavras sujas, borradas de maquiagem preta. e elas descem pelo papel feito aqueles brinquedos que reaproveitam a água. eu choro as mesmas palavras faz tempo e me sinto repetitivo na invariabilidade da minha dor. queria fazer as pazes com as minhas lembranças, sair daqui e ir visitá-las, mas sou pequeno demais para tanto. prefiro ficar. com os papéis, lágrimas e teclas. escondendo-me na maquiagem decadente.

me falta coragem pra ouvir as músicas que eu ouvia, assistir aos filmes que assistia, andar pelas ruas onde andava, com as roupas que eu vestia. quando eu ainda era pobre o suficiente para saber ser feliz. ou quando eu ainda era bom a ponto de fazer alguém feliz. me falta coragem para lembrar de tudo, dos cheiros, dos gritos que ainda podia gritar, das lágrimas que ainda podia chorar, dos sonhos que podia sonhar.

e me falta vontade.

de esquecer.

sábado, 21 de novembro de 2009

- pra água!
- quê?
- vamos pra água, o sol tá nascendo.
- ele nasce todo dia assim, sozinho.
- então hoje é o nosso dia, ele nasce para nós.
- eu tô sem roupa.
- eu também.

epifania.

mergulhos de felicidade. quatro adolescentes prepotentes testemunharam o fato mais comum do mundo. alegres.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

difícil definir meus dias não lineares. os flashes de saudade e tristeza são involuntários, ao contrário das risadas que eu insisto em dar quando estou na companhia das pessoas que gosto. estou exercitando a felicidade, como quem aprende a guiar um carro, ou como uma criança que ensaia os primeiros passos.

eu tenho fantasiado reações, inventado diálogos, interpretado livremente as ausências. tenho sido um teatro itinerante, do tipo mais pobre que existe, de rua, comédia suja. tenho acreditado nas minhas fantasias de gente sem perspectiva, no meu falso poder de ser melhor sempre. tenho criado desculpas para minhas frustrações e motivos para minha incompetente esperança.

dois mil e nove pode ter sido o pior ou o melhor ano da minha vida, mas o veredicto só os próximos podem me dar. certo é que não foi fácil.

domingo, 8 de novembro de 2009

pontuando

a vida me dificulta a escrever nesse momento. os papéis de literatura ausente atormentam minhas noites e meus dias. a caixa de correio lotada de contas e fracassos. virtuais e reais. ainda busco uma justificativa poética para a ausência de sucesso no amor. talvez sejam esses pontos que eu cismo colocar no lugar das vírgulas - metáfora.

eu adoro os pontos. as marcações de tempo que eles causam. mas acho que os banalizei. em um linha distribuo três. quatro. cinco. e assim me perco. não sei quanto duram meus períodos, meus ciclos, minha paciência. a dificuldade de me livrar dos pontos é talvez o resumo da minha vida. recortada. com tantas pausas, hiatos e voltas eu engasgo, entendo sozinho aquilo que escrevo, porque os pontos são meus e só eu sei o quanto é difícil retirá-los daqui ou dali.

minha vontade é simplificar, não abrir as caixas de correio, não preencher formulários que me buscam formular, não me submeter a amar, nem inventar programas para os próximos anos, não frustrar a mim e aos outros, não assistir a documentários, nem colocar pontos assassinos de períodos. morreu.

porque eu, meu pontos e minhas contas morremos e nascemos três, quatro, cinco vezes por linha.

Aos leitores

Depois de conversar com uns amigos, ouvir argumentos a favor e expor argumentos contrários, decidi abrir o blog para comentários por tempo indeterminado. Gostaria que vocês buscassem comentar não só os novos textos, nem só os que vocês gostam. Quero, na verdade, entender que faz vocês perderem o tempo aqui.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

do meu lado

comigo sempre foi assim,
o telefone toca e a vida muda.

de lado,
e de lado vou enfrentando as ligações,
os telefonemas
e o corte das linhas.

meus amigos sabem disso,
riem da minha cara,
de frente,
enquanto sorrio,
de lado,
enquanto choro,
de costas.

meus amores sabem,
que eu amo de lado,
ao lado,
distante.

os outros que eu pensava amigos mentem,
de cara, em volume baixo,
de costas,
para os meus amores,
que amavam de frente, de lado e de costas.

agora eu brinco nas palavras
fingindo não saber de que lado estou,
eu minto querer desvendar meus mistérios,
minhas soluções,
e venho pela poesia dizer aquilo
que não consigo explicar no bar.

enfeito,
recorto,
fantasio os defeitos,
a mostrar que me importo
com a rima da estrofe,
com os dados do agora,
com os lados,

de dentro e de fora.